17/12/2009

O Ver como apreensão, e o Olhar como aprendizagem na antropologia moderna

Texto por Luiz Bernardo Barreto

A concepção etnográfica na antropologia não se limita só ao ver, ao perceber, ao tentar enxergar. Ela vai além das percepções do primeiro plano, buscando não só uma descrição, mas também um entendimento e absorção dos objetos de estudo pesquisados. O papel do antropólogo, então, não se prende ao descobrir, mas abrange seu leque ao conhecer, ao se envolver, de forma mais imparcial possível, com o que se pesquisa.

O que nos parece particular, como a forma da linguagem, por exemplo, é de âmbito natural para aqueles que convivem entre nós... Porém, uma linguagem diferente nos soa estranho quando a desconhecemos. O pensamento é de fato cultural, mas suas atividades e práticas vão de encontro, ou desencontro, com determinados povos e regiões. “A experiência da alteridade obriga-nos a ver o que nem sequer poderíamos imaginar, a dificuldade em fixar nossa atenção naquilo que nos é habitual é tanta que acabamos por considerar que isso é assim mesmo” (Laplantine, François).

O ato de ver está estreitamente ligado ao de prever, e o conhecimento não vai além de um conhecimento do que já sabíamos. “Ver é desejar encontrar o que esperamos e não o que ignoramos ou tememos” (Laplantine, François). A distância das diferentes sociedades que por ai existem, nos permite conhecer e perceber aquilo que em nossa constituição social permanecia despercebido, desconhecido, inexplorado. O ver significa o que está na frente. É o ato de receber imagens. Essa característica não se limita ao “realmente ver”, e sim crer, em especial na possibilidade de eliminar a temporalidade.

Quando nos damos conta que nosso comportamento não tem nada de natural, percebemos o quanto mais complexo se torna uma abstração antropológica. Daí percebemos que o ver se limita ao conhecer visualmente, e o olhar a descobrir, destrinchar, passar a conhecer a fundo. “O conhecimento antropológico de nossa cultura passa obrigatoriamente pelo conhecimento das outras culturas e conduz-nos especialmente a reconhecer que somos uma cultura possível entre tantas outras, mas não a única” (Laplantine, François).

Já o olhar vai à procura das significações das variantes, das inúmeras possibilidades, da imensa quantidade de significados e significações. Nele, tem-se a capacidade de olhar bem e olhar tudo, distinguindo e discernindo o que se encontra mobilizado. Dessa forma, tal prática de exercício supõe aprendizagem, abstração, conhecimento (por vezes) material do objeto. “O trabalho etnográfico supõe um olhar que não deve ser nem tenso nem desenvolto. Donde a necessidade se volta a dar lugar também a uma atitude de deriva em ficar desatento, a se deixar abordar pelo inesperado e pelo imprevisto” (Laplantine, François).

Uma escolha consciente corresponde com a experiência de maior contato com o objeto pesquisado. Não que seja sempre de praxe a “hiperligação” com sua fonte de estudo, pois sabe-se que assim, nos somos tentados a cair no mal do partidarismo, falta da neutralidade e parcialidade. Porém o contato, não só visual, mas também material, humano, e por vezes, sem exagero (sentimental), é prática de campo que tem que ser levada a cabo com o antropólogo.

Como novos pesquisadores que somos não podemos nos iludir com o contato da fonte, do objeto de pesquisa, achar que são familiares o bastante pra estreitar o contato de forma pessoal. Porém, por outro lado, não podemos nos afastar e nos colocar em situação de melhor posição de classe, intelectualidade e abstração de um universo cultural mais amplo. É importante que nos tornemos um deles (do objeto a ser pesquisado), mas saibamos, primeiramente, o nosso lugar no campo, na prática da observação, do ver e olhar. Sendo assim, poderíamos dosar a nossa influência, tanto abstraída, como emitida, naquele que é digno de nossa pesquisa.

Como podemos perceber, essa ótica de François Laplantine disserta que o ato de ver é incompleto para uma maior abstração do elemento contido na fotografia. Sabendo que para se entender o processo cognitivo contido numa imagem, é preciso um esforço maior perante sua complexidade de significados, o autor lança a concepção do olhar, que, esse, tem por incumbência procurar e analisar detalhadamente. Destrinchar seu significado diante suas variantes.

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