22/11/2007

Os Desafios atuais para a construção da democracia

Michel Zaidan dissertou sobre a ‘judicialização da política’, e Délio Mendes defendeu uma reorganização da sociedade civil



Fotos e texto por Luiz Bernardo Barreto
Apoio técnico de Pedro Langsch



No segundo dia do 1º Encontro de Ciências Sociais da UFRPE 2007, terça-feira 07/11, se teve como pano de fundo nos debates, os “Desafios atuais para a construção da democracia”, palestrada pelo professor da UFPE, Michel Zaidan, e o prof. Délio Mendes, da UFRPE. O auditório do segundo andar do CEGOE estava cheio, e com certeza, o resultado foi bastante positivo no que diz respeito ao âmbito reflexivo que se criou no encontro.


Logo no começo do seu diálogo, Michel Zaidan fraseou: “Nós vivemos hoje uma época de desamor e ressentimento pela democracia”. Aquilo anunciava um discurso conciso e maduro. Com muita habilitação, o professor pregou que a democracia tornou-se objeto de desconsideração e desapreço, pois estava em processo de desilusão desde os anos 90 até os dias atuais. Foi justamente nessa época que houve a reforma do Estado, em que o sistema democrático ficou em segundo plano, em função do fundamentalismo fiscal, das políticas de oferta, do pós-fordismo, da inversão de prioridades dos governos, e, sobretudo, da mudança de atitude dos economistas em relação a política. “Fernando Henrique Cardoso se comportou como um verdadeiro representante comercial no Brasil e fora do País. O companheiro Lula também não ficou atrás nessa posição de presidencialismo de relações públicas”, comentou Zaidan, já adentrando no processo político atual.


A sua concepção se estruturava na idéia de que a política vai se tornando irrelevante, principalmente nas tomadas de decisões cruciais que diz respeito à gestão macroeconômica do País. Disserta também que a inversão de paradigmas nos anos 90, contribuíram para deslegitimar o regime democrático, e retirar dele um pouco de sua aura e fascínio que exerceu nos anos 80. Segundo Zaidan, a política pode prometer acabar com as mazelas da sociedade, desde que não interfira na política econômica. “A política tem que ser isolada da economia”, diz o professor. Um outro fator interferente no andamento político, é a “judicialização da política” como um fenômeno mundial, sendo o princípio canônico da separação de poderes. Na visão de Zaidan, isso teria perdido o sentido a partir do momento em que a atividade judiciária muda de função, seguindo de uma mudança paradigmática do próprio Direito.


Em sua visão, o Poder Judiciário passou a ser mais chamado para ‘se dizer’ o que é a lei. “Quanto mais aumenta a juridificação das relações sociais, mais o Judiciário é chamado à definir as leis”, registrou. Nesse entendimento, as decisões políticas do Judiciário vem usurpando muito o papel do Poder Legislativo, que, por sua vez, vem perdendo muito o seu terreno diante da judicialização da política. Em complemento ao seu raciocínio, indagou: O Poder Legislativo é esvaziado da sua competência constitucional de fazer leis. Que democracia é essa sem regime federativo, que está caindo aos pedaços? Que democracia é essa sem políticas regionais e sem descentralização tributária que fortalece os municípios? “Uma democracia de fachada e baixa identidade, pois é uma democracia que dá o voto para minorias governar o País! ”, respondeu a sua própria pergunta.


Sobre o PT, o professor afirma que a experiência política desse partido foi desastrosa no ponto de vista da renovação, porque ao invés de romper com o patrimonialismo e a captação de partidos e bancários do congresso nacional, e promover a reforma política tão esperada, o PT tirou proveito dessas mazelas históricas da política brasileira. Zaidan também chama atenção sobre a base eleitoral do Partido dos Trabalhadores, em que foi invertido do sul e sudeste, passando a ser do norte e nordeste. A explicação da ‘geografia eleitoral’, é que o PT sempre foi fortemente implantado nos grandes colégios eleitorais do Brasil, mas as regiões sul e sudeste foi captada pelo PSDB, PFL e PMDB, e o norte e nordeste ficaram com o PT, o PSB e outros partidos da base aliada do governo. “Essa mudança tem que ser bem estudada, para saber se ela significa um avanço ou um recuo”, disse o professor.


Finalizando seu diálogo, Michel Zaidan falou da conjuntura da economia com a política brasileira, e sobre a posição da imprensa sobre os assuntos políticos. “Agente não pode permitir que a nossa democracia seja uma democracia de mercado financeiro, que contemple interesses econômicos através de outras vias de decisão, e que o Congresso Nacional seja um circo de horrores que a mídia todo dia realça”. O segundo conferencista, o também sociólogo e professor da UFRPE, Délio Mendes, palestrou com o coração aberto e o sentimento à flor da pele. Dentre os assuntos abordados por Délio, via-se uma ênfase em suas frases conselheiras e esclarecedoras, onde dissertava sobre a democracia de uma forma atenuante e acessível. “Nos estamos vivendo uma sociedade sem classe”, disse o professor, que acredita que a mesma é cada vez mais individual. Em sua concepção também se entende que a contradição é cada vez mais fundamental para reger a política.


Délio Mendes também chama atenção sobre os programas de bolsas de renda, que são benefícios que substituíram os direitos. Aponta a política como elevação da sociedade para se construir a democracia, sendo esse um dos focos principais da sua palestra. “Os princípios que defendo é que não haja exploração do homem pelo homem”, registrou o professor, onde defendia ser necessário a reorganização da sociedade civil, para que hoje se lute com todas as forças por uma sociedade mais humana. Délio também lembrou que a nossa esquerda antecede a classe trabalhadora e é fora de lugar. “Nós estamos vivendo encruzilhados.., extremamente difícil”, acrescentou o professor.

Ao final de sua conferencia, Délio Mendes dialogou em forma de conselho e ensinamento: “É muito importante que nós não percamos o fio da história. Nós temos que estar organizados para transformar esse mundo em um lugar melhor, mais humano e mais capaz de fazer com que as pessoas se sintam pertencentes a esse grupo”.